Foi em Junho de 2014, na Golegã, que conquistei o slot para
a final do Campeonato do Mundo de Triatlo BTT, que iria realizar-se no Havai,
na ilha de Maui, no dia 26 de Outubro de 2014.
O circuito internacional de triatlo BTT, mais conhecido por
X-Terra, tem as suas fases de apuramento em diversos países, tendo um deles
sido Portugal, na vila da Golegã. Os atletas qualificam-se para a final do
Havai consoante o número de vagas (“slots”) disponíveis para cada escalão, e em
função da sua classificação no mesmo.
O que distingue o XTerra de qualquer outro triatlo não é só
o facto de ser em BTT, mas também a presença de obstáculos e/ou dificuldades
acrescidas nos restantes segmentos: a natação (1500mts) é em águas abertas
muitas vezes sujeitas a corrente ou ondulação forte; o BTT (35kms) tem
altimetrias respeitáveis e é tecnicamente bastante exigente; e a corrida
(10kms) é em trail, com obstáculos dos mais diversos tipos.
Posto isto, é fácil de perceber que não se trata de um
passeio na avenida, mesmo para quem seja bom triatleta ou bom betetista. Os
dias que antecederam a prova foram de calor e humidade intensos, ou não
estivéssemos no Havai, mas com chuvas que tornaram o percurso de BTT e corrida
num autêntico lamaçal. Os ventos constantes que se fazem sentir naquele
arquipélago também tornam o mar bastante batido, pelo que adivinhava-se uma
natação agitada e um BTT desafiante pelas condições do piso.
Welcome to
Xterra!
São cerca das 7h da manhã no event center, localizado no
Ritz-Carlton de Kapalua. O Parque de Transição (PT) já está aberto para os
atletas colocarem as suas bicicletas e material de prova, e uma rápida olhada
sobre a baía deixa ver o que todos adivinhávamos: estão ondas muito fortes e é
provável que haja corrente.
Os nervos já estão em franja, mas ao mesmo tempo o ambiente informal que caracteriza o XTerra ajuda a descontrair: há Pros e atletas de todas as idades, condições e origens misturados e a circular sem qualquer problema ou restrição, todos conversam com todos, todos estão no mesmo pé de igualdade, mas cada um fez o seu treino e cada um sabe o que vale!
Minutos antes da hora de partida, estamos todos já no areal, milhares de toucas coloridas enchem a Fleming Beach e todos nos assustamos com as vagas sucessivas de ondas de mais de 1.5mts que rebentam na praia… olho e à minha frente está uma atleta sem uma perna do joelho para baixo… De que me queixo eu??
Foto: João Boim |
Os nervos já estão em franja, mas ao mesmo tempo o ambiente informal que caracteriza o XTerra ajuda a descontrair: há Pros e atletas de todas as idades, condições e origens misturados e a circular sem qualquer problema ou restrição, todos conversam com todos, todos estão no mesmo pé de igualdade, mas cada um fez o seu treino e cada um sabe o que vale!
Foto: João Boim |
Minutos antes da hora de partida, estamos todos já no areal, milhares de toucas coloridas enchem a Fleming Beach e todos nos assustamos com as vagas sucessivas de ondas de mais de 1.5mts que rebentam na praia… olho e à minha frente está uma atleta sem uma perna do joelho para baixo… De que me queixo eu??
Foto: João Boim |
Soa o canhão (sim, um mini-canhão a pólvora!!) para as
atletas femininas amadoras, e lá vou eu para debaixo das ondas e da espuma! São
precisos muitos “golfinhos” para passar a rebentação inicial, após o que tento
nadar o melhor que a ondulação permite, sem conseguir sequer avistar qualquer
bóia devido à altura das ondas. Sigo nos pés da “multidão” quando sinto uma
espécie de choques eléctricos na perna direita… Percebo logo do que se trata:
uma medusa, vulgarmente designada de “alforreca”. Nadamos sem fato, pois o fato
só é permitido em águas menos quentes, o que é mais um factor que dificulta e
propicia contactos como este.
Não fico a pensar no assunto, sigo para onde toda a gente
vai, que é lá que deve estar a bóia. Na primeira bóia já há gente agarrada às
pranchas que fazem segurança… Olho para baixo e o azul profundo é lindo, como
só quem conhece a beleza do mergulho sabe apreciar. Há um cameraman debaixo de
água, e o cenário não podia ser mais sui generis…
Aproxima-se a 1ª saída da água, temos de sair com as ondas
nas nossas costas, correr umas dezenas de metros na areia e voltar a enfrentar
a rebentação para entrar na 2ª volta. Na 2ª volta as ondas ainda crescem mais,
e no regresso a corrente é brutal. O meu GPS marcou 2000mts em vez de 1500… Mas
saio da água contentíssima comigo própria. O 1º desafio já está e agora vou
para onde me sinto melhor, no BTT!
Subo o relvado que dá acesso ao PT e monto-me na Epic mal
passo a zona permitida. Extraordinário: o vento constante secou quase por
completo o piso, apesar de ter chovido imenso a noite toda! Entramos nos
primeiros single tracks que eu já conhecia do reconhecimento: desafiantes,
curvas e contracurvas, raízes, subidas, sempre no meio de floresta fechada.
Saindo dos singles, passo a dada altura numa poça e lamaçal enorme, sempre a
andar, local que eu apelidei de “Vietname”! Estamos agora na parte mais alta do
percurso, e o cenário é brutal! Há montanhas verdes em todo o campo de visão,
ou não fosse a ilha de origem vulcânica. A parte mais alta é também aquela em
que posso dar corda às rodas “top” que levo, a Epic voa como nunca e é só
ultrapassar atletas, homens e mulheres. Não só o percurso nesta fase é plano,
como começa a ter umas belas descidas. Novo “Vietname” à minha frente, já na 2ª
metade do percurso, antes de uma bela parede que existe à frente, e prestes a
entrarmos de novo nos single tracks. Quando dou por isso, já estou a chegar ao
PT, com mais de 1000mts de desnível em cerca de 32kms.
De ténis calçados sigo para a corrida trail, que tem subidas
que nunca mais acabam nos primeiros 3 ou 4 kms, pois é comum com o percurso da
bicicleta. Mas espantosamente as pernas estão a funcionar bem. Há árvores
atravessadas, troncos e raízes e é necessária muita concentração, mas ainda dei
um tropeção sem consequências, para além do facto de ter sido ultrapassada!
Chego ao fim sem quase me aperceber, porque o percurso tem
marcações em milhas e não em quilómetros! Entro no funil de meta, passo pela
bandeira portuguesa a esvoaçar junto das outras, e quando corto a meta só o
speaker estraga um pouco a minha alegria, quando anuncia o meu nome e diz que
sou da Quinta do Conde, em… Porto Rico! Não faz mal penso, enquanto alguém me
coloca uma medalha de “SURVIVOR” e um colar de flores havaianas ao
pescoço.
Atiro-me para o chão e descubro depois que sou a 7ª classificada do meu escalão! Top 10 no Campeonato do Mundo de XTerra… estou no paraíso e é como um sonho do qual não quero acordar!
Foto: João Boim |
Atiro-me para o chão e descubro depois que sou a 7ª classificada do meu escalão! Top 10 no Campeonato do Mundo de XTerra… estou no paraíso e é como um sonho do qual não quero acordar!
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